top of page

STF: é lícito eliminar um inocente para resolver um problema?

Eminentes Ministros do Supremo Tribunal Federal,

Que possam, após reto uso da razão, julgar reconhecendo que o direito à vida e a dignidade da pessoa humana exigem a criminalização do aborto.

Senão, a História haverá de cobrar, com o preço da inglória.


Clamor por ocasião do julgamento da ADPF 442, do PSOL, que pretende a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, pela não recepção parcial dos arts. 124 e 126 do Código Penal.


***


Ao leitor: não se deixe levar aqui por rótulos ideológicos. Não importa que bandeira você tem carregado nos últimos anos. Importa a verdade. Busque-a com honestidade.


***


Costuma perguntar o Papa Francisco, sem recorrer a algum preceito religioso: justo eliminar uma vida humana para resolver um problema?".


O ministro Luís Roberto Barroso disse em entrevista à TV Migalhas:


"Eu tenho o maior respeito pela convicção religiosa de todas as pessoas. Portanto, eu acho que uma pessoa tem todo direito de ser contra, pregar contra, convencer as pessoas de não fazerem. Porém, quando você criminaliza, você não aceita que o outro seja diferente, tenha circunstâncias diferentes. Essa é uma forma intolerante e autoritária de viver a vida."


Mas, Ministro, respondamos: é justo? Se é injusto, deveríamos tolerar o aborto?


É preciso deixar claro: a questão do aborto não diz respeito apenas à convicção religiosa, mas à premissa biológica, entre outras. Como se refere à biologia, e ao preceito fundamental do direito à vida, relaciona-se à bioética.


O feto é uma vida humana? É justo eliminá-lo, matá-lo? São questões relevantíssimas, e não requerem convicção religiosa alguma.


Considerando que encontremos uma conclusão necessária da bioética, obtida segundo os ditames da lógica, ela precisará se nivelar às opiniões, sob pena de intolerância, como infere o ministro? Não, tratando-se de conclusão apodítica.


Uma ADPF (isto é, uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), ademais, parte da premissa de existência de preceitos fundamentais. Tais preceitos não podem ser descumpridos. Seria isso intolerante e autoritário?


Não, se tais preceitos fundamentais não somente estão abalizados pela Constituição Federal, mas sim têm valor intrínseco anterior à positivação jurídica. A própria noção de direitos humanos o exige. É assim que é possível haver direito humano ou fundamental independente do direito positivo, o jus positum in civitate.


"Se fosse tão grande o poder das sentenças e das ordens dos insensatos, que estes chegassem ao ponto de alterar, com suas deliberações, a natureza das coisas, por que motivo não poderiam os mesmos decidir que o que é mau e pernicioso se considerasse bom e salutar? Ou por que motivo a lei, podendo transformar algo injusto em direito, não poderia transformar o mal em bem? É que, para distinguir as leis boas das más, outra norma não temos senão a da natureza. Não só o justo e o injusto, mas também tudo o que é honesto e o que é torpe, se discerne pela natureza. Esta nos deu um senso comum, que ela insculpiu em nosso espírito, para que identifiquemos a honestidade com a virtude e a torpeza com o vício. E pensar que isso depende da opinião de cada um, e não da natureza, é coisa de louco."

- Cícero, De Legibus, I, 16.


Acaso é correta a defesa dos nazistas no Tribunal de Nuremberg, onde escusaram suas atrocidades alegando que estavam apenas cumprindo ordens, conforme o ordenamento jurídico alemão? Como sabemos, não.


Assim, os "preceitos fundamentais" em sentido estrito e técnico ("preceitos fundamentais englobam os direitos e garantias fundamentais da Constituição, bem como os fundamentos e objetivos fundamentais da República, de forma a consagrar maior efetividade às previsões constitucionais", leciona o Ministro Alexandre de Moraes) só têm legitimidade se coadunados aos preceitos fundamentais em sentido amplo, universais.


O direito à vida e a dignidade da pessoa humana são preceitos fundamentais em ambos os sentidos: são direito natural, e também previstos na Constituição (arts. 5º e 1º, respectivamente).

Imagem intrauterina obtida por fetoscopia


Finalmente, chegamos ao seguinte esquema:


Argumento jurídico abortista presente na ADPF 442

Premissa 1: a criminalização do aborto fere a dignidade da pessoa humana.

Premissa 2: a dignidade da pessoa humana é preceito fundamental.

Conclusão: a criminalização do aborto descumpre preceito fundamental.


Argumento jurídico contra o aborto

Premissa 1: a prática do aborto fere a dignidade da pessoa humana e o direito à vida.

Premissa 2: a dignidade da pessoa humana e o direito à vida são preceitos fundamentais.

Conclusão: a prática do aborto descumpre preceito fundamental.


Entretanto, a premissa 1 de cada lado precisa ser destrinchada:

Como, segundo a deplorável retórica do PSOL, a criminalização do aborto fere a dignidade da pessoa humana?


"A criminalização do aborto e a consequente imposição da gravidez compulsória compromete a dignidade da pessoa humana e a cidadania das mulheres, pois não lhes reconhece a capacidade ética e política de tomar decisões reprodutivas relevantes para a realização de seu projeto de vida."

- Petição Inicial da ADPF 442, pág. 9, 2.2.2 Preceitos fundamentais violados.


Quer dizer: a capacidade de tomar "decisões reprodutivas" relevantes para a realização de projeto de vida justificaria o aborto. O feto é uma vida humana? "Indiferente", responderiam. É justo eliminá-lo? "Sim".


A ADPF 442, em suas 62 páginas de petição, não analisa a questão fundamental: "o feto é uma vida humana?". Primeiro, porque seria inoportuno entrar nesse mérito. Segundo, porque como pede o aborto até a 12ª semana, até o mais inveterado abortista precisará abster-se do argumento falacioso de que "se trata de um aglomerado de células". Terceiro, porque dizer que o feto não é uma vida humana é ignorância ginasiana. Todo manual de medicina com credibilidade considera que a vida começa na concepção. “Embora muitas vezes a discussão popular se canalize sobre a humanidade do feto ou do recém-nascido, do ponto de vista científico, tais questões estão definitivamente encerradas”, escreve Christopher Kaczor, em seu livro The Ethics of Abortion.


A literatura médica e biológica é vasta: a vida humana começa na concepção. Pesquisando, o leitor não demorará para encontrar artigos como este, do American College of Pediatricians. Mas dentro do próprio Supremo Tribunal Federal já ouvimos semelhante arguição, outrora:


"A embriologia moderna dispõe de conhecimentos extraordinários e um dos mais importantes textos de referência do mundo nessa área, adotado em inúmeras faculdades de medicina, o de Moore e Persauit, ensina que o desenvolvimento humano se inicia exatamente na fecundação (Embriologia clínica. Rio de Janeiro: Elsevier, 7a ed., 2004). No mesmo sentido Jan Langman (Medical embryology. Baltimore: Williams and Wilkins, 3a ed., 1975. pág. 3) e Bruce M. Carlson (Patten's foundations of embryology. N. York: McGraw-Hill, 6a ed., 1996. pág. 3). Assim também sustenta o Doutor Gerson Cotta-Pereira, destacado médico patologista, Chefe do Serviço de Imunoquímica e Histoquímica da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, em trabalho ainda não publicado e no qual descreve detalhadamente o processo de reprodução ("O Exato Momento em que se inicia a Vida Humana e a Terapia com as Células-Tronco")."

- Voto do Ministro Menezes Direito na ADI 3510.


Que se trata de um novo indivíduo desde a concepção (fecundação), quatro características fundamentais justificam dizer:


"1 - Novidade biológica. Quando se fundem os núcleos das células germinativas, nasce algo novo: uma informação genética que não foi nem será igual a nenhuma outra. Aí já está escrita a cor dos olhos, a forma do nariz, etc. Trata-se de um ser biologicamente único e irrepetível.

2 - Unidade. Se esse ser é uma individualidade biológica, um todo composto de partes organizadas, tem que haver um centro coordenador. O genoma é esse centro organizador, pois vai fazendo com que se deem de forma harmônica as sucessivas fases nesse novo ser biológico.

3 - Continuidade. Entre a fecundação e a morte, não ocorre nenhum salto qualitativo. Não se pode dizer que, em determinado momento, esse conjunto de células seja uma coisa, e um pouco mais tarde outra coisa diferente; todo o desenvolvimento dá-se de forma gradativa, com transições entre uma fase e a outra, de acordo com o que está previsto no genoma. A partir da fecundação, passa a existir um ser que se desenvolve de maneira contínua.

4.- Autonomia. Do ponto de vista biológico, todo o desenvolvimento ocorre do princípio ao fim de maneira autônoma: é o próprio novo ser que dirige esse desenvolvimento. A informação para dirigir esses processos vem do próprio embrião, do seu genoma. Desde o início, é o embrião quem pede à mãe aquilo de que necessita, estabelecendo-se um “diálogo químico”."

- J. Vega, D. Queipo e P. Martínez Baza, "Quem é o embrião? Bioética no início da vida"



Assim, a supracitada premissa 1 do argumento jurídico contra o aborto, "a prática do aborto fere a dignidade da pessoa humana e o direito à vida", é verdadeira, porque a forma mais imediata de exercer o direito à vida é vivendo, e a forma mais evidente de aviltar a dignidade da pessoa humana é tirando a vida de um inocente. No direito positivo, "a doutrina do Direito Constitucional dá conta de que o direito à vida comporta duas acepções: o direito de permanecer vivo; e o direito à subsistência. [...] se o embrião, como se viu, é vida, e vida humana, a decorrência lógica é que a Constituição o protege", argumentara o então Ministro do STF, Menezes Direito.


Fixar um marco por convenção, sobre o momento em que uma vida humana deve ser protegida por um direito fundamental, é arbitrário e cruel. A proposta das 12 semanas presente na ADPF 442 é inconcebível.


Mais: a alegada capacidade de tomar "decisões reprodutivas" relevantes para a realização de projeto de vida não justifica o aborto.


Decisão reprodutiva, em sentido literal, não pode afetar aquele que já foi fecundado, porque a reprodução é condição sine qua non para a existência daquele. Se a reprodução já ocorreu, não se fala em decisão. Ninguém decide realizar ou não aquilo que já está realizado. Contudo, sabemos que "decisão reprodutiva" é expressão eufemística para "decisão pró-aborto", assim como "interrupção voluntária da gravidez" é-o para "aborto". Usemos, então, termos inequívocos para o argumento do PSOL, substituindo "decisões reprodutivas" por "decisões pró-aborto":


A criminalização do aborto e a consequente imposição da gravidez compulsória compromete a dignidade da pessoa humana e a cidadania das mulheres, pois não lhes reconhece a capacidade ética e política de tomar decisões pró-aborto relevantes para a realização de seu projeto de vida.


Ou seja, tem-se um argumento sociológico, de que o aborto é relevante para a realização de um projeto de vida. Mas, indaga-se, pode-se valorar um projeto de vida acima da vida de um filho? É evidente que não pode ser esse o caminho para favorecer um projeto de vida. Qual a diferença de valor entre um bebê que vê a luz e um que ainda não vê a luz? Alguém mataria um filho de 7 anos para investir no projeto de vida? Mataria um filho em estado vegetativo para investir no projeto de vida? E matar o nascituro? A resposta mais honesta de um abortista convicto talvez fosse: "nesse caso sim, porque com o nascituro não teria muitos laços sentimentais". Tal resposta não é dada, porque é horrenda demais.


Não é justo eliminar um inocente para resolver um problema.


Sendo a vida bem jurídico relevantíssimo, cabe ao Direito Penal tutelá-lo. Portanto, a criminalização do aborto é necessária.

264 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page